O texto abaixo é retirado do blog de Sérgio Dávila, jornalista correspondente da Folha de São Paulo nos Estados Unidos. O blog você encontra aí nos favoritos.
Mostra bem como são feitas as coisas na administração Bush filho.
Um engodo. Literalmente.
Conheça "Bola Curva", o homem que começou a Guerra do Iraque
Rafid Ahmed Alfin. "Curve Ball". O "Bola Curva".
No momento em que o governo norte-americano volta a bater os tambores de guerra, desta vez contra o Irã, numa campanha muito semelhante à dos meses que antecederam a invasão de março de 2003, vale a pena conhecer a história desse iraquiano. Ele foi a principal fonte da CIA na construção da inteligência que "vendeu a guerra" ao público interno norte-americano e ao mundo ocidental.
As informações que "Bola Curva" forneceu indiretamente à agência de inteligência dos EUA eram a base principal da apresentação que o então secretário de Estado Colin Powell fez na ONU em fevereiro de 2003, aquela que dava conta de que Saddam Hussein tinha armas de destruição em massa. A mesma apresentação que Powell definiria depois, já fora do governo, como "uma mancha" em seu currículo.
Para entender como um desconhecido consegue, em última análise, começar uma guerra que dura até hoje e já matou dezenas de milhares é preciso voltar a 1999. Naquele ano, um sujeito de 33 anos que se dizia engenheiro químico iraquiano pediu asilo na Alemanha. Tinha fugido de seu país natal por razões de consciência: lá, contou às autoridades de imigração alemãs, era chefe de uma fábrica secreta de armas químicas e biológicas, a serviço do então ditador iraquiano.
Ganhou asilo e o apelido. Foi interrogado semanalmente por um ano e meio. Com a importância recém-adquirida pelas histórias que tinha, o "Bola Curva" começou a contar casos mais grandiosos. As transcrições de seus interrogatórios eram enviadas a Washington, mas a identidade, preservada. Um episódio o fez cair nas graças dos norte-americanos. Um dia, em 1998, disse, algo deu errado em uma das repartições da fábrica e 12 funcionários morreram. Era a "prova" que os agentes buscavam.
Até que um conhecido físico nuclear iraquiano também se exilou no Ocidente. Desmentiu tudo o que "Bola Curva" disse. A fábrica era de purificação de sementes. Se Saddam tivesse condições de produzir armas do tipo, ele saberia. Os alemães colocaram o suposto informante na geladeira. Aí veio o telefonema, em dezembro de 2002. Na linha estava George Tenet, então diretor da CIA.
Ele tinha um encontro com George W. Bush em dois dias e queria levar não só o caso do "Bola Curva" como pedir para que ele próprio se apresentasse na TV. As autoridades alemãs proibiram o contato, preservaram sua identidade e aconselharam o norte-americano a não usar as informações, pois nunca tinham conseguido confirmá-las. Tenet foi em frente mesmo assim.
No dia 3 de fevereiro de 2003, Colin Powell disse ao mundo inteiro, da sede das Nações Unidas, em Nova York, que Saddam tinha de fato tais armas: "A fonte é uma testemunha ocular, um engenheiro químico iraquiano que supervisionou uma dessas fábricas. Ele estava presente durante testes de agentes biológicos. Ele também estava no lugar quando houve um acidente em 1998. Doze técnicos morreram com a exposição aos agentes biológicos".
Nos dias seguintes, a ONU mandou inspetores ao local. Não encontraram nada. Em 20 de março, as bombas começaram a cair em Bagdá.
Na semana passada, o programa "60 Minutes" descobriu a identidade do "Bola Curva". Rafid Ahmed Alfin nunca se formou em química. É um maníaco-depressivo conhecido por contar mentiras. Vive com outra identidade, provavelmente na Alemanha. Foi dos agentes de inteligência alemães que ganhou o apelido "Curve Ball". É uma jogada de beisebol capciosa, em que a bola jogada com a mão direita vira à esquerda ou vice-versa. Mas também gíria para algo inesperado. Ou feito para enganar.
Rafid Ahmed Alfin: um maníaco-depressivo causou a maior guerra do século.
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