sábado, 10 de novembro de 2007

Matéria no Herald Tribune sobre o Jô

Outro astro brasileiro desponta no futebol, desta vez em Moscou

Rob Hughes

Quando um morador de Moscou é conhecido apenas como "Jo", e é guiado em suas primeiras aventuras no futebol europeu por um homem chamado Vágner Love, nós poderíamos suspeitar de estarmos entrando no reino da fantasia.

Mas foi bem real no famoso estádio San Siro, na noite de quarta-feira, quando primeiro Jo, depois Love, marcaram gols maravilhosos que colocaram o CSKA Moscou dois gols à frente da Inter de Milão. O esguio e impressionante Jo -ou João de Assis Silva- é mais um brasileiro destinado a se destacar na Liga dos Campeões.

Mas sua aventura em Milão durou apenas poucos minutos, porque a vantagem de dois gols incitou a Inter a uma represália quase imediata. No intervalo, os gigantes italianos já tinham empatado o jogo. No final, a Inter já tinha invertido a situação, vencendo por 4 a 2, com dois gols do implacavelmente enérgico argentino Esteban Cambiasso, e dois do ocasionalmente refinado sueco Zlatan Ibrahimovic.

Ainda assim, mesmo em uma noite que confirmou o Manchester United e o Arsenal como os dois primeiros times a se garantirem nas oitavas-de-final, o destaque de Jo estabelece a agenda para os jovens na Liga dos Campeões.

Ele é alto. Ele é esguio. Ele vem de São Paulo. Ele parece à vontade jogando futebol com a cabeça, com o pé esquerdo e com o direito. Com apenas 20 anos, ele poderá vir a ser um Ronaldo, um verdadeiro centroavante, sem medo de chutar a gol de qualquer ângulo, absolutamente ciente de seu toque e dos espaços que até mesmo os melhores zagueiros deixam.

Uma fração de segundo é tudo o que é preciso para um jovem que não hesita e não precisa decidir se chuta com um pé ou o outro.

O Brasil também já o convocou para todas as categorias, das de base até a principal, onde estreou contra a Turquia, em junho.

A transferência do Corinthians de São Paulo para o CSKA em Moscou pareceu tranqüila, com Jo marcando 14 vezes em seus primeiros 18 jogos na Rússia.

Na quarta-feira, assim como na primeira partida contra a Inter há duas semanas, ele marcou. Seu gol ocorreu depois de uma troca de passes com Love, e então um arremate com o pé esquerdo da entrada da grande área sem que Júlio César pudesse impedir. O goleiro também é brasileiro.

Quando Love driblou e se virou para marcar o segundo gol em seu conterrâneo, parecia que aquele seria um resultado que sacudiria o futebol europeu.

"Eu acho que os dois gols nos acordaram", disse Roberto Mancini, o técnico da Inter. "Não havia muitos torcedores nesta noite e não estávamos com o foco mental apropriado. Felizmente, meus jogadores se saíram muito bem na rápida recuperação e se transformou em um jogo bonito."

O próprio Mancini corrigiu a postura tática do time, passando de três defensores para um sistema mais sólido com quatro. Seus jogadores responderam, com Ibrahimovic e Cambiasso marcando dois gols em dois minutos.

No segundo tempo, que Jo perdeu, machucado, tanto Cambiasso quanto Ibrahimovic marcaram de novo.

O último gol, uma jogada instintiva e um belo chute de fora da área no canto superior da rede por Ibrahimovic, fez lembrar Marco van Basten na melhor forma.

"Parabéns à Inter", disse o técnico do CSKA, Valeri Gazzaev. "Nós perdemos alguns jogadores por contusão, mas a experiência da Inter fez a diferença. Ela confirma o que eu disse sobre o futebol italiano -ele é campeão do mundo e campeão da Liga dos Campeões por um motivo."

O sábio Gazzaev possivelmente conta com um campeão em suas mãos, Jo, e sem dúvida sabe mais do que nós para onde seguirá o jovem brasileiro. Poderia ser o Chelsea, a equipe londrina com a qual compartilha o benfeitor, o bilionário Roman Abramovich? Será que Jo está sendo preparado para a liga inglesa, caso o atacante marfinense Didier Drogba cumpra a ameaça de deixar a equipe na primeira oportunidade?

A Liga dos Campeões é uma vitrine no momento para todos os talentos, e alguns dos jovens mais brilhantes, Lionel Messi e Wayne Rooney, falaram nesta semana do tédio e frustração de jogar contra adversários assustados demais com a habilidade deles a ponto de praticarem o "antifutebol".

Eles são jovens demais para saber que nos anos 60, Helenio Herrera, o técnico da Inter de Milão, organizava as táticas sufocantes que se entranharam tão profundamente na alma italiana que uma geração de técnicos ainda o copia, ou tenta.

Messi se queixava sobre o Glasgow Rangers, mas o parceiro de Ronaldinho riu por último na quarta-feira. Messi armou o primeiro gol do Barcelona para Thierry Henry, marcou o segundo e estabeleceu rapidamente a vitória de 2 a 0 contra o time escocês.

O Rangers não se aventurou, não se desculpou e nem fingiu que existia no mesmo patamar que o Barcelona. Sua meta era destruir, de forma impura e simples.

Há muito disso na Liga dos Campeões. Michel Platini, o francês que nunca se curvou a ninguém como jogador, busca expandir o torneio para contar com ainda mais clubes de ligas menos ricas, mas sua preocupação deveria ser o fato de que o Barcelona, Real Madrid, os milaneses, o Manchester United e alguns poucos outros estão em uma liga própria.

Como os Rangers em Camp Nou, os ucranianos do Dínamo Kiev foram a Old Trafford com nada em mente a não ser se defenderem. Não funcionou porque o United, apesar de ter poupado jogadores importantes, venceu facilmente por 4 a 0, e apesar do reconhecimento de Rooney de que mais parecia um jogo treino, ele se juntou a Carlos Tevez, Gerard Pique e Cristiano Ronaldo na marcação dos gols.

Os clubes ingleses, espanhóis e italianos dominam o cenário europeu. Os alemães têm dificuldade para competir no mesmo nível, com Schalke, Werder Bremen e Stuttgart eliminados na primeira fase.

Mas os franceses, pelo menos o Lyon, conseguiram continuar na luta. A busca por diamantes brutos no exterior é inevitável após uma venda por alto lucro, mas agora há um novo caminho.

Ele vem das categorias de base, dos jovens sendo preparados pelo Lyon para preencherem as lacunas deixadas pelas vendas. Dois em particular, Hatem Ben Arfa e Karim Benzema, foram promovidos, para o Lyon e para a França.

Ben Arfa, 20 anos, é descendente de tunisianos. Benzema, 19 anos, é argelino. Eles são a geração pós-Zinedine Zidane, seguindo seus passos, sem dúvida inspirados por ele mesmo antes de saberem.

Na quarta-feira, foi a vez de Ben Arfa se transformar em herói. Ele marcou dois na vitória em casa do Lyon por 4 a 2 contra o Stuttgart, e falou como um veterano.

"Nós começamos a acreditar e nos assustamos", ele disse. "Tivemos dificuldades quando o jogo estava em nossas mãos e permitimos que marcassem."

"No futuro, temos que apagar os erros que vimos nesta noite." Palavras bastante ponderadas para alguém tão jovem. Ben Arfa disse ficar contente com seus gols, mas a glória é da equipe. E quer que os jogadores de sua defesa entrem em forma.

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